Patrick Mattos

Patrick Mattos

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

DA RESPONSABILIDADE DO CREDOR NA AÇÂO DE EXECUÇÃO DE DIVIDA INEXISTENTE. DA DEVIDA INDENIZAÇÃO MORAL E MATERIAL AO EMBARGANTE. ART. 574 DO CPC



O art. 574, do Código de Processo Civil, prevê expressamente que o credor deverá indenizar o devedor pelos prejuízos suportados toda a vez que decisão judicial declarar, no todo ou em parte, inexistente a dívida que fundou a execução.:
Art. 574 - O credor ressarcirá ao devedor os danos que este sofreu, quando a sentença, passada em julgado, declarar inexistente, no todo ou em parte, a obrigação, que deu lugar à execução.

Tal responsabilidade pode ser entendida como ampliação de caso especifico da responsabilidade do art. 16 do CPC:
Art. 16 - Responde por perdas e danos aquele que pleitear de má-fé como autor, réu ou interveniente.


Note-se que o ressarcimento previsto no aludido dispositivo legal é de natureza objetiva, prescindindo, portanto, da existência de dolo ou culpa.



A esse respeito, precisos os escólios do atual ministro do STF TEORI ALBINO ZAVASCKI:


"Segundo opinião generalizada da doutrina, é de natureza objetiva a responsabilidade prevista no art. 574. 'O fundamento do ressarcimento ao executado dos danos que sofreu pela execução infundada é o mesmo da condenação em custas. É o fato objetivo da derrota, ou do sucumbimento', escreveu Amílcar de Castro. Trata-se de responsabilidade objetiva que decorre do risco ligado ao ônus processual', observou Mario Aguiar Moura. Sua natureza é idêntica à da prevista para o ressarcimento dos danos em caso de execução provisória (art. 588, I), também objetiva, segundo doutrina clássica. Dispensa-se, conseqüentemente, investigação sobre dolo ou culpa. Basta, para obter ressarcimento, a prova da existência do dano - patrimonial ou moral - e da sua relação de causa e efeito com o processo de execução" ("Comentários ao código de processo civil". 2a ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, v. 8, p. 116).


Ao mesmo resultado levam as ponderações de ARAKEN:


"O elemento subjetivo (culpa 'lato sensu') é irrelevante nacaracterização de semelhante responsabilidade do credor. Os arts. 574 e 588, I, que tratam do assunto, consagram hipóteses de responsabilidade objetiva. À incidência dessas regras basta a configuração de requisito único: a emanação de provimento jurisdicional, designado de sentença, mas que abranqe qualquer ato decisório provido deste efeito, que, após a abertura do procedimento 'in executivis', desfaça o crédito excutido no todo ou em parte. É bem de ver que o processo executivo, do ângulo das regras processuais, se desenvolveu válida e legitimamente, mas produziu, fora do processo, dano injusto, porque inexistente a obrigação. Conforme acentua Chiovenda, é justo que suporte o dano o credor que provocou, em proveito próprio, a execução injusta, na medida em que o devedor não fez para provocar tal dano e sequer se encontrava obrigado a evitá- lo" ("Comentários ao código de processo civil", 1a ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, v. VI, n° 40, ps. 83-84) (grifo não original)

A invocação da responsabilidade do credor depende de manifestação expressa do devedor nos autos, sujeita à provocação do juízo, vale dizer, não é medida de ofício


De outra parte, "os danos", aos quais alude o art. 574 do CPC, devem ser entendidos em sentido amplo, abrangendo tanto o dano material como o dano moral ocasionado ao devedor pela execução infundada.



Nos dizeres de TEORI ALBINO ZAVASCKI, já citado:


"Os danos de que trata o art. 574 são os objetivamente decorrentes da existência do processo de execução. Não se limitam ao pagamento das custas e honorários advocatícios, que têm disciplina própria e são devidos em qualquer execução, e não apenas na que foi frustrada pela superveniente sentença que declarou a inexistência da obrigação.
O dispositivo fala em 'danos que [o devedor] sofreu', devendo-se compreendê-los, portanto, em sentido amplo, tais como previstos no art. 402 do CC (art. 1.059 do CC/16): abrangem, além do que o executado efetivamente perdeu, também o que deixou de lucrar.
Não há porque excluir os danos morais efetivamente comprovados, notadamente em face do que dispõe o art. 5o, X, da Constituição. (...). Em suma, são todos os danos, devidamente comprovados, que tenham relação de causalidade com o processo de execução intentado para haver o cumprimento de obrigação declarada, posteriormente, inexistente" ("Comentários ao código de processo civil", 2a ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, v. 8, p. 115) (grifo não original).

O desembargador Marcelo Cezar Muller do ínclito Tribunal do Rio Grande do Sul, em sua obra "A responsabilidade do credor segundo o artigo 574 do CPC", amplia o procedimento de responsabilidade do credor para cumprimentos de sentença, em razão de sua natureza de execução de titulo judicial, vejamos:
"A regra do art. 574, instituída pelo Código de Processo Civil de 1973 no sistema jurídico, possui caráter específico, uma vez que somente incidirá mediante a presença de todos os seus requisitos. Não se confunde com outras hipóteses de responsabilidade da parte ou mesmo do credor, as quais podem ter origem no Código de Processo ou no Código Civil. A presença de superposição de regras induz à necessidade de estabelecer critérios para a aplicação de cada uma de forma correta.

Em princípio, o dispositivo abarca qualquer espécie de execução definitiva, com origem em título judicial e extrajudicial. O cumprimento de sentença, mesmo que não gere um processo autônomo, continua sendo execução, porque visa à satisfação do crédito do vencedor da demanda. Houve a fusão em uma única relação processual das atividades cognitiva e executória, com dispensa de novo pedido de citação. O termo execução ou decisão exeqüenda continua sendo utilizada na lei, sendo exemplos o art. 475-I, caput e §§ 1º e 2º, e o art. 475-B, § 3º, do CPC.
Dessa maneira, quando se trata de processo execução ou cumprimento, a responsabilidade do credor, de maneira específica, pode ter duas origens: a) art. 574; b) art. 475-O, I (art. 588, I, antes da Lei 11.232/2005), do CPC. A primeira regra, objeto deste estudo, tem aplicação à execução definitiva, a segunda à execução provisória, e ambas fazem transparecer o princípio da responsabilidade.
No que se refere ao processo de execução regulado por lei especial, se esta não dispuser de regra própria sobre a responsabilidade do credor e, se for cabível, pode haver aplicação subsidiária do Código de Processo."


Vejamos precedente judicial sobre a responsabilidade do credor por execução de divida declarada inexistente:
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. ART. 574 DO CPC. É responsabilidade do exequente ressarcir o devedor pelos danos causados em caso de ser declarada inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que deu lugar à execução. Art. 574 do CPC. A liquidação dos danos pode ser efetuada nos próprios autos da execução, não havendo necessidade de ajuizamento de ação autônoma. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70038993176, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Roberto Imperatore de Assis Brasil, Julgado em 26/01/2011)


Em posicionamento de vanguarda, o Tribunal do Rio Grande do Sul condenou o Município em Execução Fiscal a indenizar o contribuinte executado por divida de IPTU declarada inexistente, ampliando o cabimento do art. 574 do CPC à fazenda pública:

 
Ementa:
EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. MANIFESTO DESCABIMENTO. DANOS MORAIS. ART. 574, CPC. Apresentando-se manifestamente infundada execução fiscal, de elevado valor, que cumula conduta inaceitável do Poder Público, primeiro retirando, ilegalmente, a posse dos proprietários e, depois, cobrando-lhes, injustificadamente, o tributo predial, contra o que já fora manifestado judicialmente ao ser reconhecido o apossamento administrativo, inafastável a configuração de afetação da esfera extrapatrimonial daqueles que se submeteram a tal conduta, permitindo o art. 574, CPC, o reconhecimento e condenação dos danos derivados do indevido processo executivo. PROCESSUAL CIVIL. SUCUMBÊNCIA. HIERARQUIA DAS PRETENSÕES. REDEFINIÇÃO. Considerando-se a substância das pretensões e sua hierarquia, e não apenas dado numérico, configura-se, no caso dos autos, nitidamente, a maior derrota do Município, o que leva a que se redefina a distribuição e quantitativos dos encargos sucumbenciais. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70046489993, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa, Julgado em 25/01/2012


A liquidação dos danos, todavia, pode ser efetuada nos próprios autos da execução, não havendo necessidade de ajuizamento de ação autônoma. A respeito do tema, cito a lição de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero:
"3. Apuração dos Danos. A liquidação dos danos pode ocorrer mediante requerimento nos próprios autos da execução. Não é necessária a propositura de ação condenatória. A ilicitude da execução vai evidenciada desde logo a partir do trânsito em julgado da decisão que declara inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que deu lugar à execução. Com o trânsito em julgado há certeza a respeito do ilícito. Cumpre a partir daí apenas discutir o nexo causal e o importe do dano causado, o que pode ocorrer mediante liquidação por arbitramento (art. 475-C, CPC) ou por artigos (art. 475-E, CPC)."
 

Logo, a extinção de ação executiva fundada na inexistência da divida implica a incidência do artigo 574 do CPC, liquidando-se os prejuízos nos próprios autos em que se processou a execução.

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