Patrick Mattos

Patrick Mattos

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

DA IMPOSSIBILIDADE DE COBRANÇA DE TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRAS EM EMPREENDIMENTOS COM ENTREGA ATRASADA


A taxa de evolução de obra é uma tarifa paga pelo adquirente durante o período de construção do imóvel. No entanto, torna-se ilegal quando o consumidor continua a pagá-la após o prazo no contrato para a entrega das chaves. Além disso, a correção de juros sobre seu valor é considerada abusiva. Segundo a AMSPA (Associação dos Mutuários de São Paulo e Adjacências), quando alguma dessas alternativas ocorre, o proprietário prejudicado pode exigir judicialmente a devolução do dinheiro em dobro, com juros e correção.

Nos empreendimento do programa Minha Casa Minha Vida, subsidiado com os recursos da Caixa Econômica Federal, os futuros residentes pagam a taxa de evolução de obra, que em média, corresponde a 2% sobre o valor do apartamento, durante a fase de edificação do imóvel.

“Por culpa da construtora que não cumpre o prazo contratual para a entrega do empreendimento, os proprietários continuam pagando a taxa para o agente financeiro mesmo após o prazo para entrega da obra, o que é uma prática ilícita”, alerta Marco Aurélio Luz, presidente da AMSPA.

Segundo Luz, a cobrança da taxa de obra tem como finalidade pressionar as construtoras inadimplentes com a Caixa a não atrasarem a entrega do empreendimento. “O erro do agente financeiro está no fato de que essa taxa deve ser cobrada da construtora, e não do comprador, que não tem culpa nenhuma pelo não cumprimento do contrato. Portanto, após o prazo previsto para a entrega, é ilegal cobrar a taxa de obra, além de ser ‘um dinheiro jogado fora’, já que não amortiza o saldo devedor”, salienta.



Logo à taxa de evolução de obra, é referente aos juros decorrentes do empréstimo que a construtora faz com o banco e que são repassados aos compradores, não podendo ser cobrada após a data estipulada para a entrega da obra, visto que o atraso é culpa exclusiva da construtora.

A referida taxa já foi objeto de denúncia pelo Ministério Público Federal segundo noticiado em 24/10/2013 no site do Ministério Público Federal do Pará, assim:

MPF vai à Justiça para impedir cobrança de taxa de evolução de obras em empreendimentos com entrega atrasada

Clientes denunciam atrasos nas entregas e cobrança de valores indevidos
24/10/2013 às 10h26
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou nesta quarta-feira, 23 de outubro, ação civil pública para impedir que a Caixa Econômica Federal e a Incorporadora PDG continuem cobrando de seus consumidores taxas de evolução da obra em empreendimentos que estão com a entrega atrasada. O valor é referente aos juros decorrentes do empréstimo que a construtora faz com o banco e que estariam sendo repassadas indevidamente aos compradores.
De acordo com denúncia de uma cliente da Incorporadora PDG a entrega do imóvel estava prevista para junho de 2012 (ou com o atraso contratual previsto até dezembro do mesmo ano). Após esse prazo, além do imóvel não ter sido entregue começou a ser cobrado um valor denominado evolução da obra. A partir da denúncia foi instaurado inquérito civil que comprovou a cobrança da taxa considerada ilegal pelo Código de Defesa do Consumidor.
"Referida conduta contribui ao enriquecimento ilícito da empreendedora, bem como, viola as regras do direito do consumidor. Ou seja, as atitudes ilegais das requeridas prejudicam sobremaneira o consumidor, hipossuficiente na relação de consumo", ressalta o texto da ação assinada pelo procurador da República Bruno Araújo Soares Valente.
Ainda segundo a ação, a conduta da Caixa de realizar cobrança de juros antes da entrega das chaves aos adquirentes dos imóveis viola as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor. Essa cobrança de juros, se legítima, deve recair apenas sobre a incorporadora, que é a única beneficiária do financiamento durante a fase de construção do imóvel.
"Nessa etapa da obra, as residências se encontram em fase de edificação e a infraestrutura do condomínio está sendo implementada pela construtora, a qual é a única beneficiada com os recursos do financiamento, frisando-se ainda que a Caixa repassa os valores à construtora de maneira coletiva, de acordo com o cronograma físico-financeiro das obras", explica a ação.
Caso a Justiça julgue procedente a ação, o MPF pede que os valores cobrados indevidamente sejam restituídos, em dobro, aos consumidores lesados e que, em caso de descumprimento da decisão, seja cobrada das multa de R$ 10 mil para cada consumidor que sofreu cobrança indevida.

Processo nº 0029333-15.2013.4.01.3900 - 2ª Vara Federal em Belém

É de praxe a cobrança da referida taxa em empreendimentos que estão com a entrega atrasada, porém tal exigência deve recair apenas sobre a incorporadora, que é a única beneficiária do financiamento durante a fase de construção do imóvel, daí porque se a construtora é a responsável pelo atraso na entrega.

Logo se cobrada após a data estipulada para a entrega do empreendimento. É devida a restituição, pela construtora, dos valores que estão sendo pagos, e devem continuar até que se decida o contrário, pelo comprador ao agente financiador.

Nesse sentido:

OBRIGAÇÃO DE FAZER - ATRASO NA ENTREGA DA OBRA - CLÁUSULA PENAL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS - TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA/ INCC - DANO MORAL A cláusula penal estipula, previamente, o montante da reparação por perdas e danos, caso uma das partes descumpra o contrato. Havendo previsão de cláusula penal, incabível a indenização a título de danos materiais, decorrentes de gastos com aluguéis, sob pena de se configurar bis in idem. Constatada a mora injustificada da construtora, o ônus quanto ao pagamento de taxa de evolução da obra, ou reajuste pelo INCC, não pode ser imputado aos promitentes compradores que não concorreram para o atraso na entrega da obra. Entendo que deve ser mantida condenação ao pagamento de indenização por danos morais, já que a situação ocorrida não pode ser enquadrada como mero aborrecimento ou dissabor. "Não se verifica a ocorrência do dano moral, posto que o descumprimento de contrato de compra e venda não caracteriza a ofensa aos sentimentos, honra ou dignidade do comprador, por estar assegurado o direito de ação de rescisão do contratual, e não estarem demonstradas repercussões negativas na sua vida". "O ressarcimento dos aluguéis e o pagamento da multa pactuada não implica bis in idem, uma vez que a mencionada multa tem natureza compensatória, ou seja, visa compensar o tempo em que os apelantes não puderam usufruir do imóvel como era de seu direito, ao passo que pagamento dos aluguéis diz respeito às despesas que os recorrentes tiveram diante da mora da construtora. O atraso na entrega do imóvel enseja lesão a direito de personalidade do comprador. A indenização por danos morais deve ser fixada com observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade".(v.v.). TJ-MG - AC: 10145130196754001 MG , Relator: Evangelina Castilho Duarte, Data de Julgamento: 13/02/2014, Câmaras Cíveis / 14ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 21/02/2014)

Ementa: INDENIZATÓRIA. CONSUMIDOR. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. REPETIÇÃO DE VALORES PAGOS A TÍTULO DETAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA E COMISSÃO DE CORRETAGEM. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. VALOR DA CAUSA QUE CORRESPONDE, NO CASO CONCRETO, À VANTAGEM ECONÔMICA ALMEJADA PELA PARTE AUTORA, INFERIOR AO TETO DOS JUIZADOS ESPECIAIS. SENTENÇA EXTINTIVA DESCONSTITUÍDA. REMESSA À ORIGEM PARA PROLAÇÃO DE NOVA SENTENÇA, SOB PENA DE SUPRESSÃO DA INSTÂNCIA. RECURSO PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71004681359, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Fernanda Carravetta Vilande, Julgado em 27/11/2013)
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. APARTAMENTO NA PLANTA, ATRASO NA ENTREGA. CLÁUSULA PENAL OU MULTA. DANOS MORAIS. O inadimplemento culposo da construtora justifica a imputação de perdas e danos, consistentes na restituição da denominada taxa de evolução da obra e da cláusula penal arbitrada pelo juízo, sem restituição do valor da correção monetária do período transcorrido durante o inadimplemento, que tão só atualiza o preço. As circunstâncias, graves em si mesmas, presumem o dano moral indenizável. (Apelação Cível Nº 70059409953, Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Cini Marchionatti, Julgado em 14/05/2014)

(TJ-RS - AC: 70059409953 RS , Relator: Carlos Cini Marchionatti, Data de Julgamento: 14/05/2014, Vigésima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 20/05/2014)


Logo constatada a mora injustificada da construtora, o ônus quanto ao pagamento de taxa de evolução da obra, ou reajuste pelo INCC, não pode ser imputado aos promitentes compradores que não concorreram para o atraso na entrega da obra


terça-feira, 23 de setembro de 2014

DO SIGILO BANCÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE ACESSO DIRETO DO FISCO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. INCONSTITUCIONALIDADE






O Supremo Tribunal Federal, admitiu Repercussão Geral no Recurso Extraordinário n. 601314 ⁄SP, para decidir acerca da constitucionalidade do fornecimento de informações sobre movimentações bancárias de contribuintes, pelas instituições financeiras, diretamente ao Fisco, sem prévia autorização judicial (Relator Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 22.10.2009, DJe 20.11.2009).

Após, quando do julgamento do RE n 389808 ⁄PR, realizado em 15.12.2010 (DJe 10.5.2011), o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, decidiu pela inconstitucionalidade da interpretação dada à norma que autoriza a Receita Federal a ter acesso direto aos dados bancários do contribuinte (no caso, a Lei n. 9.311⁄1996, a Lei Complementar n. 105⁄2001 e o Decreto n. 3.724⁄2001); considerou, assim, indispensável prévia autorização judicial para quebra de sigilo bancário, sem o que não se imporá à instituição financeira o dever de fornecer – seja à administração tributária, seja ao Ministério Público, seja, ainda, à Polícia Judiciária – as informações que lhe tenham sido solicitadas.


Na ocasião, o Relator, Ministro Marco Aurélio, asseverou que não se pode transferir a atuação do Judiciário, "reservada com exclusividade por cláusula constitucional, a outros órgãos, sejam da administração federal, sejam da estadual, sejam da municipal". Ainda, salientou que "admitindo-se que a Receita Federal pode ter acesso direto, por que meio for, a dados bancários de certo cidadão, dever-se-á caminhar no mesmo sentido, por coerência sistêmica, para dar idêntico poder às Receitas estadual e municipal".
O Superior Tribunal também firmou o posicionamento no sentido de que o fornecimento de informações sobre movimentação bancária de contribuintes, pelas instituições financeiras, diretamente ao Fisco, sem prévia autorização judicial, com o consequente oferecimento de denúncia com base em tais informações, é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.
A propósito, confira-se o seguinte julgado:

HABEAS CORPUS. ARTIGO 1º, INCISO I, DA LEI N.º 8.137⁄90. RECEITA FEDERAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO.INVIABILIDADE. NÃO CONHECIMENTO. VIA INADEQUADA. ILEGALIDADE FLAGRANTE. NULIDADE DA PROVA. CONCESSÃO DA  ORDEM EX OFFICIO.
(...)
2. Hipótese, contudo, em que há flagrante ilegalidade a ser reconhecida.
3. A quebra do sigilo bancário para investigação criminal deve ser necessariamente submetida à avaliação do magistrado competente, a quem cabe motivar concretamente seu decisum, em observância aos artigos 5º, XII e 93, IX, da Carta Magna.
4. Não cabe à Receita Federal, órgão interessado no processo administrativo tributário e sem competência constitucional específica, fornecer dados obtidos mediante requisição direta às
instituições bancárias, sem prévia autorização do juízo criminal, para fins penais.
5. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem, de ofício, para, reconhecendo nula a prova decorrente da quebra de sigilo bancário aqui tratada, anular a denúncia e a consequente ação penal, ressalvando a possibilidade de nova demanda ser proposta, com base em prova lícita.
(HC n. 258.460⁄SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 5.8.2014, DJe 18.8.2014).

RECURSO EM HABEAS CORPUS. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. NECESSIDADE. NULIDADE DA PROVA. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
1. Este Superior Tribunal firmou o posicionamento no sentido de que o fornecimento de informações sobre movimentação bancária de contribuintes, pelas instituições financeiras, diretamente ao Fisco, sem prévia autorização judicial, com o consequente oferecimento de denúncia com base em tais informações, é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio. Precedentes.
2. Considerando que não houve prévia autorização judicial para a quebra do sigilo bancário do recorrente, bem como que a denúncia lastreou-se apenas em elementos dela obtidos, não há como não afastar a nulidade da ação penal.
3. Ainda que se alegue ou que se sustente, com base na Lei Complementar n. 105, artigo 6º, que é possível o acesso a essas informações bancárias pela autoridade fazendária, sem autorização judicial, não há como isso ser possível para fins de investigação no processo criminal, pela previsão constitucional expressa a respeito.
4. Recurso em habeas corpus provido para, reconhecendo nulas as provas obtidas mediante a quebra de sigilo bancário aqui tratada, anular a denúncia e a consequente ação penal, ressalvada a possibilidade de que nova demanda seja proposta em desfavor do recorrente, com base em prova lícita (Processo n.
0010951-90.2007.4.03.6110, da 3ª Vara Criminal Federal da Subseção Judiciária de Sorocaba/SP).
(RHC 34.952/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 04/09/2014, DJe 15/09/2014)

HABEAS CORPUS. ARTIGO 1º, INCISO I, DA LEI N.º 8.137/90. RECEITA FEDERAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. INVIABILIDADE.
NÃO CONHECIMENTO. VIA INADEQUADA. ILEGALIDADE FLAGRANTE. NULIDADE DA PROVA. CONCESSÃO DA  ORDEM EX OFFICIO.
1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucional, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevidamente a ordem como substitutiva de recurso ordinário.
2. Hipótese, contudo, em que há flagrante ilegalidade a ser reconhecida.
3. A quebra do sigilo bancário para investigação criminal deve ser necessariamente submetida à avaliação do magistrado competente, a quem cabe motivar concretamente seu decisum, em observância aos artigos 5º, XII e 93, IX, da Carta Magna.
4. Não cabe à Receita Federal, órgão interessado no processo administrativo tributário e sem competência constitucional específica, fornecer dados obtidos mediante requisição direta às instituições bancárias, sem prévia autorização do juízo criminal, para fins penais.
5. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem, de ofício, para, reconhecendo nula a prova decorrente da quebra de sigilo bancário aqui tratada, anular a denúncia e a consequente ação penal, ressalvando a possibilidade de nova demanda ser proposta, com base em prova lícita.
(HC 258.460/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 05/08/2014, DJe 18/08/2014)

Assim, quando sem prévia autorização judicial houver quebra do sigilo bancário direto pela instituição fazendária, bem como quando a denúncia lastrear-se apenas em elementos dela obtidos, deve ser imediatamente declarado a nulidade do processo administrativo.

O sigilo bancário é projeção da garantia fundamental da intimidade das pessoas. Trata-se de uma reserva de jurisdição que, portanto, condiciona-se a uma autorização judicial pela autoridade judiciária competente, mediante decisão fundamentada.

Então, ainda que se alegue ou que se sustente, com base na Lei Complementar n. 105, artigo 6º, que é possível o acesso a essas informações bancárias pela autoridade fazendária, sem autorização judicial, não há como seja isso possível para fins de investigação no processo criminal, pela previsão constitucional expressa a respeito.
 
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