O art. 574, do Código de Processo Civil, prevê
expressamente que o credor deverá indenizar o devedor pelos prejuízos
suportados toda a vez que decisão judicial declarar, no todo ou em parte,
inexistente a dívida que fundou a execução:
Art. 574 - O credor ressarcirá ao devedor os danos
que este sofreu, quando a sentença, passada em julgado, declarar inexistente,
no todo ou em parte, a obrigação, que
deu lugar à execução. (grifos nossos)
O supracitado
artigo processual seguia o entendimento do que dispunha o revogado art. 1.531
do Código Civil de 1916: "Aquele que demandar por dívida já paga, no
todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas, ou pedir mais do que for
devido, ficará obrigado a pagar o devedor, no primeiro caso, o dobro do que
houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se, por
lhe estar prescrito o direito, decair da ação."
Alguns
doutrinadores entendem que com a revogação do código civil, o referido
dispositivo foi recebido pelo art. 940 CC/02 que trata da repetição de
indébito, outros doutrinadores entendem que o art. 1531 foi recepcionado no
novo código civil pelos art. 17 e 18 que tratam de litigância de má-fé.
Porém ao
nosso entender, tratam-se de disposições diferentes, sendo o art. 574 do CPC
uma reparação pecuniária equivalente aos danos sofridos pelo executado, podendo
ser cumuladas com repetição de indébito e litigância de má-fé caso o magistrado
decida pela suas utilizações.
Ao nosso
entender, o art. 574 do CPC é uma sanção reparatória exclusiva da ação de
execução, podendo ser requerido via embargos à execução, exceção de
pré-executivdade e impugnação.
Há divergência na doutrina
sobr e qual o meio apto para o
devedor obter a declaração da inexistência da obr igação
e o reconhecimento do direito à indenização pelo dano sofrido. Podem, desde
logo, ser mencionados: ação autônoma; embargos do devedor, impugnação a
execução e ação rescisória.
A legitimidade ativa é do devedor, parte demandada na
ação executiva ou no cumprimento da sentença, interpretação mais condizente com
a regra em exame.
É pacífico o entendimento doutrinário e
jurisprudencial no sentido de que a indenização prevista no referido
dispositivo legal exige que o credor tenha agido de má-fé ao demandar o devedor
por dívida já paga, total ou parcialmente, sem ressalvar valores recebidos. Tal
entendimento, inclusive, está contido analogicamente na Súmula 159⁄STF:"Cobrança
excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções do art. 1531 do Código Civil."
Nesse sentido, os seguintes precedentes
desta Corte Superior: REsp 730.861⁄DF, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ de
13.11.2006, p. 252; REsp 730.861⁄DF, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ de
13.11.2006, p. 252; REsp 507.310⁄PR, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de
1º.12.2003, p. 319; REsp 403.444⁄DF, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho
Junior, DJ de 24.3.2003, p. 228; REsp 256.304⁄SP, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy
Rosado de Aguiar, DJ de 18.9.2000, p. 136; AgRg no REsp 130.854⁄SP, 2ª Turma,
Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 26.6.2000, p. 140; REsp 99.683⁄MT, 3ª Turma,
Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 15.6.1998, p. 115.
Note-se que o ressarcimento previsto no aludido dispositivo legal é de
natureza objetiva, prescindindo, portanto, da existência de dolo ou culpa.
A esse respeito, precisos os escólios do atual ministro do STF TEORI
ALBINO ZAVASCKI:
"Segundo opinião generalizada da doutrina, é de natureza objetiva a
responsabilidade prevista no art. 574. 'O fundamento do ressarcimento ao
executado dos danos que sofreu pela execução infundada é o mesmo da condenação
em custas. É o fato objetivo da derrota, ou do sucumbimento', escreveu Amílcar
de Castro. Trata-se de responsabilidade objetiva que decorre do risco ligado ao
ônus processual', observou Mario Aguiar Moura. Sua natureza é idêntica à da
prevista para o ressarcimento dos danos em caso de execução provisória (art.
588, I), também objetiva, segundo doutrina clássica. Dispensa-se,
conseqüentemente, investigação sobre dolo ou culpa. Basta, para obter
ressarcimento, a prova da existência do dano - patrimonial ou moral - e da sua
relação de causa e efeito com o processo de execução" ("Comentários
ao código de processo civil". 2a ed., São Paulo: Revista dos Tribunais,
2003, v. 8, p. 116).
Ao mesmo resultado levam as ponderações de ARAKEN:
"O elemento subjetivo (culpa 'lato sensu') é irrelevante na caracterização
de semelhante responsabilidade do credor. Os arts. 574 e 588, I, que tratam do
assunto, consagram hipóteses de responsabilidade objetiva. À incidência dessas
regras basta a configuração de requisito único: a emanação de provimento
jurisdicional, designado de sentença, mas que abranqe qualquer ato decisório
provido deste efeito, que, após a abertura do procedimento 'in executivis',
desfaça o crédito excutido no todo ou em parte. É bem de ver que o processo
executivo, do ângulo das regras processuais, se desenvolveu válida e
legitimamente, mas produziu, fora do processo, dano injusto, porque inexistente
a obrigação. Conforme acentua Chiovenda, é justo que suporte o dano o credor
que provocou, em proveito próprio, a execução injusta, na medida em que o
devedor não fez para provocar tal dano e sequer se encontrava obrigado a evitá-
lo" ("Comentários ao código de processo civil", 1a ed., Rio de
Janeiro: Forense, 1999, v. VI, n° 40, ps. 83-84) (grifo não original)
De outra parte, "os danos", aos quais alude o art. 574 do CPC, devem ser entendidos em sentido amplo, abrangendo tanto o dano material como o dano moral ocasionado ao devedor pela execução infundada.
Nos dizeres
de TEORI ALBINO ZAVASCKI, já citado:
"Os danos de que trata o
art. 574 são os objetivamente decorrentes da existência do processo de
execução. Não se limitam ao pagamento das custas e honorários advocatícios, que
têm disciplina própria e são devidos em qualquer execução, e não apenas na que
foi frustrada pela superveniente sentença que declarou a inexistência da
obrigação.
O dispositivo fala em 'danos
que [o devedor] sofreu', devendo-se compreendê-los, portanto, em sentido amplo,
tais como previstos no art. 402 do CC (art. 1.059 do CC/16): abrangem, além do
que o executado efetivamente perdeu, também o que deixou de lucrar. Não há porque excluir os danos morais
efetivamente comprovados, notadamente em face do que dispõe o art. 5o, X, da
Constituição. (...). Em suma, são todos os danos, devidamente comprovados, que
tenham relação de causalidade com o processo de execução intentado para haver o
cumprimento de obrigação declarada, posteriormente, inexistente"
("Comentários ao código de processo civil", 2a ed., São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2003, v. 8, p. 115) (grifo não original).
Inegável, por
outro lado, que a conduta do exequente em distribuir ação judicial de divida já
paga total ou parcialmente, submete, injustamente, o executado a uma situação
vexatória, causando-lhe aborrecimento e dissabor, além de abalo ao seu crédito.
É possível ao executado obter a declaração de
inexistência da obr igação através de
ação autônoma, impugnação ao cumprimento de sentença, embargos do devedor, ação
rescisória ou agravo de instrumento. Mesmo que o fundamento da declaração surja
após o ajuizamento da execução é viável o reconhecimento da responsabilidade do
credor. Apenas o ajuizamento de execução, independente de outro ato, sendo
declarada inexistente toda a obr igação,
pode gerar a obr igação de indenizar,
caso tenha sido atingida a esfera
jurídica do executado. A liquidação dos danos pode ser procedida nos
mesmos autos ou em apenso, como incidente, sendo importante a observância dos
princípios do processo civil e a racionalidade dos atos, o que fornecerá a
melhor solução para o caso concreto.
Logo, o legislador processual não permitiu que o credor
utilizasse a ação expropriatória sem qualquer sanção por irresponsabilidade, e
permitiu o executado requerer reparação dos danos sofridos pela execução
temerária, estando essa responsabilidade do credor exposta no art. 574 do CPC.
Nenhum comentário:
Postar um comentário