Patrick Mattos

Patrick Mattos

sábado, 15 de fevereiro de 2014

DA NULIDADE DA MULTA DE TRANSITO SEM NOTIFICAÇÃO VÁLIDA E DECADÊNCIA DA EMISSÃO DA NOTIFICAÇÃO.




É de vasto conhecimento de todos que as multas de trânsito são um verdadeiro pesadelo para os motoristas em geral, e o órgão público deve cumprir certas formalidades para que a multa seja materializada e cobrada do condutor/proprietário, sendo a notificação essencial para constituir o proprietário em mora e oportunizar o contraditório e a ampla defesa, para que assim a multa possa ser cobrada.

1. Defesa prévia. Notificação pessoal.
No processo administrativo para imposição de multa de trânsito, é jurisprudência pacífica que são necessárias duas notificações :

1ª: a notificação da lavratura do auto de infração de trânsito e
2ª: a notificação da aplicação da penalidade

A notificação do auto de infração pode ser pessoal ou via postal.
Considera-se notificação pessoal a assinatura do auto de infração pelo infrator, nos termos do artigo 280, inciso VI, do Código Nacional de Trânsito , que pode ser o condutor/proprietário e condutor/não proprietário.
Exaure-se a notificação pessoal com a assinatura do auto de infração (a) pelo condutor/proprietário e (b) pelo condutor/não proprietário na hipótese de infração na direção do veículo .
Em se tratando, contudo, de infração imputada ao proprietário, assim definida no § 2º do artigo 257 do Código Brasileiro de Trânsito , a par da assinatura do auto de infração pelo condutor, é indispensável a notificação ao proprietário.
Nesse sentido, uniformizou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de que são exemplo os seguintes acórdãos da Primeira e Segunda Turmas:

AgRg no REsp 922.733/RS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/05/2008, DJe 16/06/2008), Rel. Min. Luiz Fux: 
“ (...)
Deveras, não obstante superada a questão atinente à validade da primeira notificação feita em flagrante ao condutor do veículo, notadamente porque o Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 280, VI, determina que deverá constar do auto de infração a assinatura do infrator, sem fazer qualquer distinção entre proprietário ou condutor do veículo, esta Corte, à luz da exegese do art. 257, §§ 1º, 2º, 3º e 7º do CTB c/c art. 2º e 3º da Resolução 149/2003/CONTRAN, concluiu que: "(...)nova notificação de autuação deve ser expedida, mesmo em caso de notificação in faciem, quando a infração for relativa ao veículo e, portanto, de responsabilidade do proprietário que não estava na condução do veículo." (RESP 824.437/RS, Relatora Ministra Eliana Calmon) 10. A análise do thema, à luz da novel jurisprudência desta Corte e da legislação atinente à matéria, conduz à seguinte conclusão: a) a notificação in faciem do condutor em flagrante, mediante a assinatura do auto de infração, valerá como notificação da autuação quando a infração for de responsabilidade do condutor e sendo a infração de responsabilidade do proprietário este estiver conduzindo o veículo; b) no caso de a infração ser de responsabilidade do proprietário e este não estiver conduzindo o veículo, a autoridade de trânsito expedirá, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contados da data do cometimento da infração, a Notificação da Autuação dirigida ao proprietário do veículo, na qual deverão constar, no mínimo, os dados definidos no art. 280 do CTB e em regulamentação específica (art. 3º  da Resolução 149/2003 do CONTRAN).Precedentes do STJ: RESp 921443/RS, 2ª Turma, DJ 29.05.2007 e REsp 820434/DF, 2ª Turma, DJ de 2.08.2006”.

AgRg no REsp 904.042/RS, Rel. Ministra  ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/09/2009, DJe 24/09/2009:
“(...)
1. No "iter" processual administrativo deve a autoridade obedecer aos princípios constitucionais e às normas disciplinadoras.
2. A Lei 9.503/97 prevê uma primeira notificação de autuação, para apresentação de defesa (art. 280) e uma segunda notificação, posteriormente, informando do prosseguimento do processo, para que se defenda o apenado da sanção aplicada (art. 281). Matéria decidida de acordo com o rito do art. 543-C do CPC, no REsp nº 1.092.154-RS, Rel. Min. Castro Meira, julg. em 12/08/2009.
3. Em regra, o auto de infração em flagrante, devidamente assinado pelo condutor, supre a primeira notificação para fins de defesa prévia.
4. Entretanto, nova notificação de autuação deve ser expedida, mesmo em caso de notificação in facie, quando a infração for relativa ao veículo e, portanto, de responsabilidade do proprietário que não estava na condução do veículo. Interpretação do art. 257, §§ 1º, 2º, 3º e 7º do CTB c/c art. 2º e 3º da Resolução 149/2003 – CONTRAN.
5. Ilegalidade da sanção, por cerceamento de defesa, quando inobservados os prazos estabelecidos no "iter" procedimental.
6. Agravo regimental não provido”.

Após a multa, deve ser lavrados os autos em flagrante, porquanto não estão assinados pelo infrator e não indicam o seu nome ou, proceder a expedição da notificação da autuação da infração.

De todo modo, só a notificação da autuação à vista do infrator não é suficiente para garantir o exercício da defesa. Deve, ainda, ser observado o prazo de trinta dias entre a notificação da autuação e a notificação da imposição da penalidade de trânsito, de que são exemplo os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

AgRg no REsp 746756/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, publicado no DJU de 08.08.2005, p. 208:
6. A autuação in facie do infrator torna inexigível posterior notificação, sendo esta equivalente àquela (art. 280, VI, do CTB). A notificação da autuação in facie deve anteceder o lapso de 30 (trinta) dias para que seja enviado o auto de infração para pagamento, em virtude de que este é o prazo mínimo exigido pela legislação para o oferecimento da necessária defesa prévia.

REsp 731749 / RS, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, publicado no DJU de 06.06.2005, p. 230:
III - Pode-se concluir, a final, que a inexistência de posterior notificação do proprietário do veículo acerca de auto de infração lavrado em flagrante, nos casos em que tenha sido o ato infracional cometido por terceiro-condutor, não constitui nulidade do procedimento administrativo, remanescendo válidas e hígidas as penalidades daí derivadas, desde que observado o prazo de trinta dias imposto por Lei entre a notificação da infração e a notificação da multa imposta. Precedente: REsp nº 567.038/RS, Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ de 01/07/2004.

Na espécie, entre as infrações – e as eventuais autuações em flagrante - e a aplicação da penalidade devem decorrer 30 dias, caso contrário nulas serão as sanções aplicadas.
                                                                                                                        
2. DA DESCONSTITUIÇÃO dos autos de infração de trânsito.

No dia 12 de agosto de 2009, ao julgar o REsp 1.092.154/RS, Rel. Min. Castro Meira, na forma do artigo 543-C do Código de Processo Civil, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, “não havendo a notificação do infrator para defesa no prazo de trinta dias, opera-se a decadência do direito de punir do Estado”, em acórdão assim ementado:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ N.º 08/2008. AUTO DE INFRAÇÃO. NOTIFICAÇÃO. PRAZO. ART. 281, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DO CTB. NULIDADE. RENOVAÇÃO DE PRAZO. IMPOSSIBILIDADE. HONORÁRIOS.
SÚMULA 7/STJ.
1. O Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97) prevê uma primeira notificação de autuação, para apresentação de defesa (art. 280), e uma segunda notificação, posteriormente, informando do prosseguimento do processo, para que se defenda o apenado da sanção aplicada (art. 281).
2. A sanção é ilegal, por cerceamento de defesa, quando inobservados os prazos estabelecidos.
3. O art. 281, parágrafo único, II, do CTB prevê que será arquivado o auto de infração e julgado insubsistente o respectivo registro se não for expedida a notificação da autuação dentro de 30 dias. Por isso, não havendo a notificação do infrator para defesa no prazo de trinta dias, opera-se a decadência do direito de punir do Estado, não havendo que se falar em reinício do procedimento administrativo.
4. Descabe a aplicação analógica dos arts. 219 e 220 do CPC para admitir seja renovada a notificação, no prazo de trinta dias do trânsito em julgado da decisão que anulou parcialmente o procedimento administrativo.
5. O exame da alegada violação do art. 20, § 4º, do CPC esbarra no óbice sumular n.º 07/STJ, já que os honorários de R$ 500,00 não se mostram irrisórios para causas dessa natureza, em que se discute multa de trânsito, de modo a não poder ser revisado em recurso especial. Ressaltou o acórdão recorrido esse monante remunera "dignamente os procuradores, tendo em vista a repetividade da matéria debatida e sua pouca complexidade".
6. Recurso especial conhecido em parte e provido. Acórdão sujeito ao art. 543-C do CPC e à Resolução STJ n.º 08/2008. (grifou-se)


Logo se opera a decadência do direito de a Administração Pública renovar o processo administrativo relativo aos autos de infração de trânsito impugnados, em razão da desconstituição da penalidade, quando decorrer o prazo de 30 dias a que alude o artigo 281, inciso II, do Código de Trânsito Brasileiro.

Nesse sentido, ainda, o Recurso Especial nº 1.071.154/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, publicado em 09 de outubro de 2009:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. MULTA DE TRÂNSITO. ANULAÇÃO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. INOBSERVÂNCIA DA REGRA SINTETIZADA NA SÚMULA N. 312/STJ. ART. 281 DO CTN. IMPOSSIBILIDADE DE REABERTURA DE PRAZO PARA NOVA NOTIFICAÇÃO. ENTENDIMENTO PACIFICADO NA PRIMEIRA SEÇÃO.
1. O cerne da irresignação consiste em definir se é possível a abertura de novo prazo para notificação prévia na hipótese de o procedimento administrativo, que culmina com a aplicação da multa, ter sido anulado por inobservância da regra resumida na Súmula n. 312/STJ. O Tribunal a quo entendeu admissível a abertura do aludido prazo, ao fundamento de que a anulação do procedimento administrativo não invalida o auto de infração, não se configurando a decadência do jus puniendi estatal.
2. A Primeira Seção, interpretando o art. 281, parágrafo único, II, do CTB, firmou entendimento de que a anulação do procedimento administrativo não possibilita uma nova abertura ou reinício do prazo de trinta dias para a notificação a fim de apresentação de defesa prévia. Assim, decorrido o referido interregno, deve ser declarada a decadência do direito de punir do Estado.
3. Recurso especial provido para decretar a decadência do direito do Estado para aplicar a multa de trânsito porque, com a anulação do procedimento administrativo, já decorreu o prazo legal de 30 dias, sendo inviável a reabertura do prazo previsto no art. 281, parágrafo único, do CTB.
Ainda não havendo prova de notificação do condutor/proprietário considerar inválida a sanção.

A notificação e a ciência inequívoca do condutor/proprietário é um direito constitucional para que se materialize o contraditório e a ampla defesa conforme art. 5o  inciso LV da CF.

A Constituição da República teve a preocupação, destaque-se, de expressar tal garantia como válida não apenas aos processos sob a jurisdição judicial, mas também aqueles tramitados em esferas administrativas.

Logo deve ser interpretado conforme a constituição, e de forma relativa os arts. 123 e 282, § 1º, do CTB, que dispões ser do proprietário do veículo a responsabilidade por manter atualizado seu endereço perante o órgão de trânsito:

Art. 123. Será obrigatória a expedição de novo Certificado de
Registro de Veículo quando:
I - for transferida a propriedade;
II - o proprietário mudar o Município de domicílio ou residência;
III - for alterada qualquer característica do veículo;
IV - houver mudança de categoria.

Art. 282. Aplicada a penalidade, será expedida notificação ao proprietário do veículo ou ao infrator, por remessa postal ou por qualquer outro meio tecnológico hábil, que assegure a ciência da imposição da penalidade.

§ 1º A notificação devolvida por desatualização do endereço do proprietário do veículo será considerada válida para todos os efeitos.

O 1§ do art. 282 é claramente inconstitucional, pois não existe presunção de notificação válida por endereço desatualizado. Após frustrada a notificação postal o órgão de transito tem obrigação de realizar a notificação editalícia para que a mesma seja considerada válida e assim possa cobra-la do infrator, caso contrário a multa é claramente passível de nulidade:

Ementa: APELAÇÕES CÍVEIS. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. APLICAÇÃO DE PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO. OBSERVÂNCIA DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA E DEVIDO PROCESSO LEGAL. Na espécie está demonstrada a observância dos princípios do contraditório e ampla defesa nos autos do processo administrativo que culminou na suspensão do direito de dirigir do apelante. No caso dos autos, frustrada anotificação pelo correio junto aos endereços constantes perante o órgão administrativo de trânsito e também apontado pelo infrator na declaração do imposto de renda, cabível a notificação por edital. Procedimento legal que foi devidamente observado pelo réu, não havendo falar em ofensa à ampla defesa e ao devido processo legal. Precedentes. Ao proprietário do veículo incumbe o ônus de manter atualizado seu cadastro, forte nos artigos 123 e 282, §1º, do CTB. APELO DA PARTE RÉ PROVIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA PREJUDICADO. (Apelação Cível Nº 70052327749, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Luiz Reis de Azambuja, Julgado em 04/12/2013)

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. MULTA DE TRÂNSITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO AUTO DE INFRAÇÃO DE TRANSITO. NOTIFICAÇÃO POR EDITAL. NECESSÁRIA A COMPROVAÇÃO DA TENTATIVA ATRAVÉS DE CARTA AR DEVOLVIDA. É necessária a comprovação da tentativa de notificação através de carta AR devolvida para possibilitar e justificar a notificação editalícia. Apelo desprovido. (Apelação Cível Nº 70051766947, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 30/01/2013)


Ementa: DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE MULTA DE TRÂNSITO. Hipótese em que o conjunto probatório dos autos evidencia que a motocicleta encontrava-se na titularidade do autor no período de 01.03.2007 a 20.10.2010, bem como que as infrações de trânsito foram lavradas no dia 28.05.2010, ou seja, no período em que o autor era proprietário da motocicleta. Assim, restou devidamente demonstrada a responsabilidade do autor (proprietário do veículo) pelas multas de trânsito. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. NOTIFICAÇÃO. PROPRIETÁRIO. ENDEREÇO DESATUALIZADO. LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO ADOTADO. No que tange à notificação das infrações, os documentos juntados aos autos comprovam que o demandado enviou correspondências de notificação ao proprietário do veículo, para o endereço constante dos seus registros, sem, todavia, obter êxito, uma vez que este mudou de endereço sem comunicar a autoridade de trânsito. Conforme dispõem os arts. 123 e 282, § 1º, do CTB, é do proprietário do veículo a responsabilidade por manter atualizado seu endereço perante o órgão de trânsito. Ao depois, ainda que as tentativas de notificação do autor tenham sido frustradas, o demandado realizou notificação editalícia. Assim, não há falar em nulidade das infrações de trânsito. APELAÇÃO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. (Apelação Cível Nº 70056233356, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 08/10/2013)

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